A atresia anal é uma malformação congênita rara em felinos, resultante de falhas no desenvolvimento embrionário da região cloacal. Entre suas classificações, a atresia anal tipo IV destaca-se pela presença de uma comunicação anômala entre o reto e a vagina, configurando uma fístula retovaginal. Essa condição cursa com manifestações clínicas severas, incluindo tenesmo, distensão abdominal, retenção fecal e eliminação de fezes através da vulva, o que compromete a qualidade de vida do animal e o predispõe a infecções ascendentes do trato urinário. O presente trabalho objetiva relatar um caso de atresia anal tipo IV em gata doméstica, com complicações como estenose anal, megacólon e megarreto, tratado com sucesso por meio de intervenção cirúrgica corretiva. Foi atendida uma gata, sem raça definida, um ano de idade e histórico de três procedimentos cirúrgicos prévios, realizados sem sucesso terapêutico definitivo, mantendo os sinais clínicos de dor abdominal, constipação crônica e evacuação de fezes com formato de fita pela abertura vaginal. Ao exame físico detalhado, foram evidenciadas a estenose anal e a comunicação retovaginal. A confirmação diagnóstica foi obtida por meio de radiografia abdominal simples, que revelou acentuada dilatação colônica e retal compatível com megacólon e megarreto - complicações associadas à resolução tardia da anomalia retal. Como medidas iniciais, a paciente recebeu suporte clínico intensivo, incluindo fluidoterapia, antibioticoterapia de amplo espectro e manejo da dor. Após estabilização clínica, foi realizada uma abordagem cirúrgica pela via perineal. O procedimento incluiu a identificação e cuidadosa dissecção das estruturas retal e vaginal, seguida da ressecção da porção fibrosada do reto. A reconstrução foi realizada com a técnica de "pull-through", permitindo o reposicionamento e a fixação adequada do reto à abertura anal recém-criada. Durante o transoperatório, complicações como hipotermia foram manejadas com aquecimento ativo. No pós-operatório imediato, a paciente recebeu analgesia multimodal, antibioticoterapia, suporte nutricional com uma dieta pastosa e de fácil digestão, oferecida em pequenas porções para favorecer o trânsito intestinal e minimizar o esforço evacuatório. Embora a incontinência fecal tenha sido observada nos primeiros dias, o animal apresentou melhora clínica progressiva. Radiografias de controle realizadas 14 dias após a cirurgia demonstraram o restabelecimento do trânsito intestinal normal e a resolução do megacólon. A retirada dos pontos ocorreu sem intercorrências e, após três dias, a paciente recebeu alta hospitalar, mantendo evolução clínica satisfatória no acompanhamento ambulatorial. Contudo, apesar da ocorrência de recidivas, complexidade cirúrgica e risco de complicações, a intervenção corretiva aliada a cuidados pós-operatórios rigorosos proporcionou um prognóstico favorável e melhora significativa na qualidade de vida da paciente.